A entrevista de hoje é com Vanessa Brites, mãe de uma criança com SII e na dieta low FODMAP. Um testemunho importante para quem tem filhos com esta patologia e que convive diariamente com os desafios de uma alimentação adaptada em idade escolar.
Este artigo insere-se na temática de partilha de experiências de pacientes e profissionais de saúde com a dieta low FODMAP. Depois do testemunho do nutricionista Fábio Cardoso, a convidada de hoje é a Vanessa Brites. A Vanessa é mãe de uma criança que sofre da Síndrome do Intestino Irritável. O A. tem 10 anos e segue a dieta low FODMAP em casa e na escola.
Obrigado pelo convite. O A. tinha queixas constantes de dor de barriga, que começaram quando tinha quatro anos, após internamento por salmolena. Era dia sim, dia não a ir buscá-lo à escola, queixas da barriga a remoer e remoer, diarreias, muitas idas à casa de banho, acordar mal disposto, ir para a cama mal disposto, já não sabia o que fazer… Tem agora 10 anos e só de há um ano e meio para cá é que conseguimos ter qualidade de vida graças a esta alimentação – a dieta low FODMAP.
O A. começou a ser seguido no hospital em consultas de gastrentologia e ao fim de alguns exames e consultas foi-nos marcada consulta com a dietista. Foi aí que ouvimos falar pela primeira vez da dieta low FODMAP. Considero que, tanto ele como eu, fomos bem acompanhados e informados. Ficámos com informação escrita e uma lista de alimentos permitidos, moderados e proibidos.
Inicialmente foi um susto grande porque nunca tinha ouvido falar da dieta low FODMAP. Comecei por pesquisar na internet e segui algumas páginas e grupos. Havia alimentos que nem faziam parte sequer da nossa alimentação e que desconhecíamos até como se confeccionavam, como é o caso da quinoa ou das acelgas. Foi uma descoberta e inicialmente um problema, talvez por não ter informação e por não saber nada. Agora deixou de ser um problema.
Logo no inicio seguimos a tal lista que nos foi dada, ou seja retirámos todos os alimentos da dieta para avaliar se os sintomas desapareciam. Após algumas semanas começámos a adicionar alimentos um a um e apontando sempre os sintomas associados ao seu consumo. E assim depois de algum tempo conseguimos ter a nossa própria lista.
O meu filho apresenta muitas melhorias e hoje sei exatamente o que pode e não pode comer.
Tenho um menino super responsável e cuidadoso, que sabe o que deve e não deve comer. Tem consciência que é para o bem dele, e sabe que o que fazemos em casa é o melhor para ele. Tento fazer coisas apetitosas e sempre com um bocadinho de surpresa para concorrer com todas aquelas montras cheias de coisas deliciosas e muito apelativas para os miúdos. Ele tem noção que ter saúde é o mais importante.
O A. tem uma alimentação variada dentro das opções que a dieta lhe permite. Não consome alimentos processados e enlatados, glúten ou lactose. Como optamos por uma alimentação mais natural, a maior parte dos lanches e snacks são feitos em casa.
Também foi uma adaptação sendo que inicialmente havia o prato do A. e o nosso. Agora ajustamos apenas o dele. Por exemplo, se fazemos massa, a do A. também é massa mas sem glúten. Nós como família já temos alguns cuidados com a alimentação, o que faz com que as coisas não sejam assim tão complicadas.
Na escola inicialmente foi uma luta para que a alimentação fosse baixa em FODMAP e não apenas um prato vegetariano (foi logo o que pensaram). No inicio disse que estaria disponível para fazer as refeições para ele levar para a escola. A resposta foi que a escola apenas permitia refeições no refeitório confeccionadas lá. Então, a gastrenterologista que sempre o acompanhou passou uma declaração para entregar na escola e mesmo assim ouvi que o A. teria de comer à parte dos seus amigos. Como para mim não era algo aceitável ficou combinado que a escola iria então ajustar a ementa diária às necessidades do A. No inicio não correu bem e o A. dizia: “hoje não comi a carne porque tinha molho. Deram-me só as batatas” ou “hoje não comi a sopa, só comi o segundo prato”. Para além de estar a criar ansiedade ao meu filho todos os dias, a escola não estava a garantir o almoço completo. Fazia a ementa para todos e depois na hora do almoço do A. era retirado o que não podia. Ouvi diariamente as suas queixas de que não comeu o segundo prato, ou a sopa, o acompanhamento e até a fruta. Reclamei junto da escola e da nutricionista responsável e foi-me dito que a equipa da cozinha iria ter formação sobre esta dieta. Consegui finalmente sensibilizar a professora e quem o acompanha na escola. Tenho todos os meses contacto com a nutricionista da Câmara Municipal pertencente à escola e com as senhoras da cozinha. Há uma ementa só para ele que me é enviada a cada mês. Inicialmente andava frustrada por estar a ser difícil mas agora estou feliz. Só tenho a agradecer a todos porque neste momento já não é um problema e o A. é tratado por todos com bastante carinho. Hoje o A. tem uma ementa variada, uma refeição completa e que ele gosta, o que é bom. A escola está a terminar e para o próximo ano irá para outra escola. Já está combinado um rever da situação do A. para que nada falhe e ele continue a ter os cuidados necessários para continuar a seguir esta dieta.
É verdade que foi necessário “meter as garras de fora”, uma vez que como mãe não aceitava o mais ou menos. “Se é assim que ele tem que comer têm que garantir”, pensei eu. Inicialmente bati de frente pois só o queria ver nas melhores condições. Consegui… conseguimos! Já há inclusivamente na escola do A. outro menino a seguir também a dieta low FODMAP.
Parece assustador mas não é nenhum bicho de sete cabeças. Inicialmente é preciso tempo e dedicação. O blog My Gut Feeling e o grupo de facebook low FODMAP Portugal, ajudaram-me muito a perceber que não estava sozinha e ainda hoje ambos fazem a diferença nos meus dias seja em dicas de receita ou partilha de experiências pelo que as considero como um bom suporte para quem convive com esta realidade diariamente. Espero com a minha partilha poder ajudar a tirar algumas dúvidas ou receios de quem se depara pela primeira vez com a Síndrome do Intestino Irritável e a necessidade de introdução da dieta Low Fodmap no dia a dia das suas crianças.
Muito obrigada!
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